O Conselho Internacional de Museus (Icom) lançou, no Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo, a Red List Brasil, ou Lista Vermelha, uma publicação que reúne os objetos culturais mais sujeitos à retirada ilícita do país e de comercialização ilegal no mercado internacional. Com isso, o Brasil se torna o 20º país ou região a ter uma Red List de Objetos Culturais em Risco.
O lançamento da Red List Brasil contou com a participação da ministra da Cultura Margareth Menezes, evento que marcou a sua primeira agenda pública em São Paulo, desde que tomou posse. “Esse é um dos maiores desafios: combater o tráfico ilícito dos nossos bens culturais”, disse a ministra, durante o evento. Segundo ela, esse tipo de tráfico é um dos que mais movimenta dinheiro no mundo.
“A frequência com que os bens culturais brasileiros são ilegalmente retirados do país, além de suas especificidades, justificou a elaboração da Red List Brasil. O Brasil ocupa o 26ª lugar na lista de países com maior número de objetos culturais roubados e tem uma taxa de recuperação extremamente baixa. O tráfico ilícito de bens culturais é um prejuízo imenso para o Brasil porque mexe com o testemunho do processo civilizatório do nosso povo. Cuidar da memória e fortalecer nossa história é um registro do mapa da nossa evolução cultural”, disse.
O banco de dados do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) listou 974 bens culturais brasileiros que são procurados após terem sido roubados ou furtados. Dessa lista, apenas 48 foram recuperados.
Red Lists
As Red Lists, ou Listas Vermelhas, são publicadas desde 2000 pelo Icom e detalham categorias de bens culturais que são ameaçados de extinção em todo o mundo. Segundo Emma Nardi, presidente global da Icom, a publicação não é uma lista de objetos roubados, mas apresentam tipologias de obras sob risco de tráfico, que são descritos e ilustrados por fotografias. Essas imagens auxiliam os agentes fiscalizadores a identificar possíveis movimentações ilegais.
“As Listas Vermelhas são ferramentas que ilustram categorias dos bens culturais mais vulneráveis de cada país. A publicação dessas listas ajuda as autoridades a identificar os objetos em risco e a evitar que eles sejam vendidos ou exportados ilegalmente”, explicou Anauene Dias Soares, especialista no combate ilícito de bens culturais e coordenadora técnica da publicação. “Para termos um objeto inserido na Lista Vermelha ele precisa ser identificado em uma lista de tipologias e de bens culturais protegidos por legislação nacional e internacional”.
Até este momento, foram publicadas listas para algumas regiões como Sudeste Europeu e África, além de países como China, Peru, Afeganistão, Colômbia, Haiti, Iraque e Síria. Antes do Brasil, a última edição havia sido dedicada à Ucrânia, em função da invasão russa e aumento do risco de pilhagem.
“Para fazer a Red List é importante saber se o país tem uma legislação potente. Só se pode colocar em uma Red List um objeto que esteja protegido. A legislação brasileira é bastante robusta, mas o Brasil é um país de dimensão continental e de fronteira muito porosa. Depois, é preciso entender que existe um tráfico e um interesse no mercado e só então começamos a fazer um mapeamento do que seriam as categorias”, disse Roberta Saraiva Coutinho, que ajudou a elaborar a Red List Brasil.
Red List Brasil
No Brasil, a Red List, que durou oito anos para ser feita, incluiu cinco categorias que são mais visadas pelos traficantes: arqueologia; arte sacra e religiosa; objetos etnográficos; paleontologia; e livros, documentos, manuscritos e fotografias. Cada uma dessas categorias contém imagens que ilustram objetos que poderiam atrair traficantes tais como cocares indígenas, urnas funerárias pertencentes a comunidades indígenas, objetos rituais de origem africana e uma escultura em terracota de Nossa Senhora da Conceição.
Entre esses objetos listados também está a primeira edição do livro Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis. “A Lista Vermelha Brasil é um reconhecimento dos riscos da nossa região, mas também do reconhecimento e visibilidade da diversidade e riqueza do patrimônio brasileiro”, disse Renata Mota, diretora executiva do Museu de Língua Portuguesa e presidente do Icom Brasil.
A Lista Vermelha brasileira apresenta, pela primeira vez, histórias em quadrinhos e objetos de paleontologia, como fósseis. “É uma lista muito inovadora porque traz uma categoria só de bens paleontológicos. Essa é a primeira vez que isso aparece em uma Red List. E também temos três itens de origem africana na categoria de arte sacra, entre eles, uma escultura de Xangô. Inclusive, incluímos materiais bibliográficos, que são bens muito traficados e também fazem parte da nossa lista. As histórias em quadrinhos são também uma grande inovação, que até hoje não haviam entrado nas Red Lists”, disse Anauene Dias Soares.
A Lista Vermelha brasileira foi lançada nos idiomas português e inglês e, em breve, deverá ser lançada também em espanhol, sueco e francês. A edição brasileira, disse Roberta Saraiva Coutinho, foi considerada uma das mais bonitas. “Ela espelha o nosso patrimônio”.
A publicação será distribuída às autoridades policiais e alfandegárias do mundo todo para que elas consigam identificar as peças brasileiras mais ameaçadas pelo tráfico.