Memória: saber recordar e saber esquecer

Ao falar de "memória", a neuropsicóloga Celina Vallim, explica que se refere ao processo de codificação, armazenamento e recuperação da informação. Existem vários sistemas de memória que se distinguem pelo material envolvido, pelo marco temporal sobre o qual operam e pelas estruturas neurais que as sustentam. Confira o artigo.

Por: Dra. Celina Vallim
25/08/2022

Ao falar de “memória”, referimo-nos ao processo de codificação, armazenamento e recuperação da informação. Existem vários sistemas de memória que se distinguem pelo material envolvido, pelo marco temporal sobre o qual operam e pelas estruturas neurais que as sustentam. Uma classificação geral diferencia a memória relacionada com atos conscientes (memória explícita ou declarativa) de outras, como reflexos condicionados ou habilidades motoras que não dependem de um pensamento consciente (memória implícita ou de procedimento). A memória explícita se divide, por sua vez, em dois sistemas:

1) o armazenamento e a recordação de experiências pessoais ocorridas em um tempo e lugar particulares (por exemplo, recordar o dia em que nasceu nosso filho ou que terminamos o segundo grau), denominado “memória episódica”;

2) o armazenamento de conhecimentos representativos de fatos e conceitos, assim como palavras e seus significados (por exemplo, que Paris é a capital da França ou a que nos referimos quando dizemos a palavra “vaca”), denominado “memória semântica”. Por seu lado, a memória de trabalho — antes denominada “de curto prazo”, se refere ao sistema da memória responsável pela recordação imediata de quantidades limitadas de dados verbais ou espaciais que estão disponíveis para a manipulação mental imediata.

Recordar por si só não é uma habilidade única, mas sim um processo formado por diversas habilidades ou capacidades. A capacidade de se lembrar de algo, como dissemos, envolve três estados diferentes: codificação, armazenamento e recuperação.

Algumas pessoas acham de grande ajuda pensar nisso como o ato de incorporar, processar e encontrar um livro numa enorme biblioteca:

Codificar: significa incorporar a informação registrada. Em nossa analogia, o bibliotecário põe num novo livro a assinatura ou o código e o registra no catálogo no lugar correspondente.
Armazenar: trata de guardar a informação na memória até que se necessite dela. Para que isso seja eficaz, ela é mantida em um lugar que seja fácil de encontrar. Na analogia, o livro é colocado em uma estante da seção correspondente.
Recuperar: inclui recuperar a recordação quando for necessário. Em comparação com a biblioteca, se uma pessoa quer um livro ela tem que consultar o catálogo, ir buscá-lo onde ele estiver, localizá-lo na estante e pegá-lo.
Uma ressalva importante na comparação que apresentamos é que, na memória, diferentemente da biblioteca, o tempo que passa entre a incorporação da informação e sua solicitação desempenha um papel preponderante.

Usando esse enfoque, então, podemos dividir a memória em:

Memória de trabalho (de segundos a minutos).
Memória de longo prazo (dias e anos).
Memória prospectiva.
A memória de trabalho ou imediata é a memória utilizada para a informação que foi apresentada segundos antes. Por exemplo, usamos esse aspecto da memória quando olhamos para um número de telefone e o mantemos na mente só o tempo indispensável para poder anotá-lo. Também é indispensável para fazer um cálculo mental ou para compreender um enunciado completo.

A memória de longo prazo compõe um sistema diferente, no qual a informação é armazenada até que se necessite dela oportunamente. Essa memória é formada por diversas partes e inclui a memória diferida, a memória recente e a memória remota. Vejamos:

A memória diferida: é a memória para os acontecimentos passados ou a informação apresentada poucos minutos antes. Estaríamos usando essa memória se, no exemplo anterior, houvéssemos nos esforçado para reter o número de telefone e lembrando-o meia hora depois.
A memória recente: é a dos eventos passados ou a informação que foi apresentada uns dois dias antes; por exemplo, o que fizemos no último fim de semana.
A memória remota: é a dos acontecimentos passados ou a informação que se apresentou alguns anos antes; por exemplo, coisas ocorridas em nosso tempo de escola.
Por último, a memória prospectiva é a das coisas que estamos planejando fazer no futuro (por exemplo, lembrar o telefonema que devemos dar a uma amiga, ir a uma entrevista num hospital no próximo mês ou mandar uma mensagem de aniversário a um amigo em determinado momento). Essa capacidade de prever cenários futuros específicos poderia estar estreitamente relacionada com a capacidade de se lembrar de

episódios concretos de nosso passado (ou seja, a memória episódica). De fato, as pessoas que não conseguem se lembrar de detalhes específicos de seu passado podem estar com alguma alteração em sua capacidade de vislumbrar mentalmente experiências pessoais futuras.

Texto extraído do livro: Usar o cérebro – editora planeta

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