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O impacto da violência sexual sofrida por mulheres com transtornos mentais

O Perito Rildo Silveira explica as consequências e os danos que essa violência pode acarretar e o assunto passa a ser mais delicado ainda quando as vítimas são pessoas com transtornos mentais.

Por: Correio Nogueirense
08/07/2019
Tecnicamente falando, a violência sexual engloba qualquer ato sexual ou tentativa de ato sexual não desejados, comentários ou insinuações sexuais não desejados, atos de tráfico ou atos dirigidos contra a sexualidade de uma pessoa usando coerção, por parte de qualquer pessoa, independentemente de sua relação com a vítima e em qualquer contexto.
“Como já falei em muitas outras ocasiões, a violência sexual não é só à penetração da vulva, do ânus ou de outra parte do corpo com pênis, pois a violência sexual inclui também a penetração com objetos e inclui também a agressão, o molestamento, assédio e incesto” explica Rildo.
Independentemente de ter ou não algum tipo de relacionamento com o abusador, a violência sexual pode acarretar danos imensos com consequências devastadoras (curta e longo prazo e na maioria dos casos permanentes), que vão da contração de doenças sexualmente transmissíveis (DST) e gestação não desejada até o desenvolvimento de várias fobias, pânico, transtornos de ansiedade, do sono, alimentar (bulimia e anorexia também), depressão e síndrome do estresse pós-traumático.
Em tudo disso, pode-se desencadear problemas em relações familiares, sociais e ao mesmo tempo profissionais, como por exemplo o abandono dos estudos e dos próprios objetivos de vida e profissionais, assim como a perda do emprego e até tentativa de suicídio que é uma das piores e entre as mais frequentes de todas consequências de um abuso sexual.
O assunto passa a ser mais delicado ainda quando as vítimas são pessoas com transtornos mentais, sem dúvidas uma das categorias mais vulneráveis na nossa sociedade. “Começo pelo princípio que pessoas com transtornos mentais (severos ou persistentes) sofrem muitas vezes com a exclusão social decorrente do preconceito de ser consideradas por muitos como “os/as loucos/as”. Isso muitas vezes isola esta pessoa da sociedade, tornando ela como verdadeiras vítimas, e colocando-a em plenas dificuldades para finalizar estudos, conseguir emprego e mesmo se comunicarem, situação que parece dificultar ainda mais o desenvolvimento da autonomia para o autocuidado e a autodefesa” Diz o perito.
Ele continua, “Devo ser sincero: a coisa que mais me deixa com nojo muitas vezes desta sociedade poluída é o fato que essas pessoas em muitos casos são vistas tanto por muitos profissionais de saúde como pela sociedade como assexuadas ou como pessoas com uma sexualidade fora de controle. São muito raros os serviços que realizam ações com foco na sexualidade desse grupo. Assim, a saúde sexual das pessoas com transtornos mentais vem sendo negada e omitida principalmente quando são vítimas de abuso sexual (isso tanto em crianças e adolescentes quanto com adultos)”.
Rildo explica sobre o preconceito que essas pessoas vivem, “Este preconceito infelizmente existe também dentro das mesmas famílias e instituições que deveriam cuidar das pessoas com transtornos mentais. Em muitos casos de abuso sexual infantil e estupro cometido contra estas pessoas extremamente vulneráveis (menores e adultos), temos inúmeras situações onde houve total descaso tanto dos familiares (que desacreditaram e não denunciaram as violências) quanto das instituições. Esta é uma clara demonstração do fato que tanto fora quanto dentro do seio familiar em muitos casos, principalmente as mulheres com transtornos mentais, não encontram nenhum tipo de apoio, e isso deve levar todos nós á uma profunda reflexão”, explica.
O Perito conta sobre casos que já analisou, “Recentemente analisei alguns relatos de mulheres com transtornos mentais sobre suas vivências relacionadas ás violências sofridas. Uma situação em particular chamou minha atenção onde a vítima ( que hoje é moradora de rua) afirmou ter sido violentada pelo próprio pai com frequência e por muito tempo, quando ainda não havia tido nenhum relacionamento sexual. Esta mulher-vítima contou quando decidiu falar tudo para a própria mãe, e o resultado foi praticamente uma outra violência. Esta vítima procurou apoio na própria mãe, falou tudo e toda dinâmica da violência sofrida e ela não acreditou no relato da própria filha, e pior ainda, afirmou que ela era mentirosa e louca. O resultado das consequências de tanta omissão, descaso, falta de empatia e negligência levou esta vítima a tomar uma decisão drástica pelo futuro da própria vida e que hoje é a realidade que vive: a única opção para se livrar da situação de violência e de omissão que vivia foi ir para a rua e morar lá. Aí pergunto: quantos casos como este existem? Garanto que são muitos, inúmeros, e por este motivo é preciso de mudanças”, contou.
Segundo Rildo, é preciso pontuar que muitas destas vítimas, por causas das violências sofridas vivem constantemente com ideias suicidas, que perduram mesmo quando ela “teoricamente” se considera bem. Tudo isso deve ser motivo e necessidade para que sejam capacitados e formados profissionais de saúde para atuar e lidar também em situações delicadas como estas.
O Perito diz sobre o objeto de falar sobre o assunto e o que espera, “O objetivo desta matéria de hoje, e agradeço mais uma vez o Correio Nogueirense pela oportunidade, é levar a sociedade a se auto-conscientizar através do conhecimento da realidade destas pessoas extremamente vulneráveis, conscientizar e incentivar os grupos de apoio á mulher sobre a informar-se, apoiar e elaborar projetos de apoio para o cuidado integral de mulheres com transtornos mentais, especialmente a respeito a sua saúde sexual, que é um direito fundamental de todo e qualquer cidadão. Tudo isso é importante para criar ações também voluntárias voltadas para a construção da igualdade de gênero e para a promoção da cidadania e da dignidade dessas pessoas. Aproveito para agradecer de coração mais uma vez a Doutora Paula Mary, Delegada Chefe de Policia Federal, a pessoa que é o nosso verdadeiro símbolo no combate aos crimes contra crianças e adolescentes e exploração sexual infantil, e que através do seu maravilhoso exemplo de competência, sensibilidade e empatia se tornou uma grande referência tanto como pessoa quanto como profissional para todos nós profissionais que atuamos no combate á pedofilia, Exploração e abuso sexual infantil. Outro agradecimento é para a Doutora Leticia Mobis, Delegada de Policia Civil da Delegacia de Atendimento á Mulher em Três Lagoas (Mato Grosso do Sul) cujo trabalho em prol das mulheres é simplesmente sensacional”, finalizou.
Conheça quem é Rildo Silveira:
  • Perito Judicial e Analista de Crimes contra Crianças e Adolescentes registrado no Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro (Cadastro atualizado nos moldes da Resolução 02/2018 do E.Conselho da Magistratura)
  • Especialidades e Áreas de atuação pelo Judiciário: Crimes contra Crianças e Adolescentes – Violência Doméstica – Análise Criminal
  • Árbitro Jurídico da 8a Câmara de Mediação, Conciliação e Arbitragem do Estado do Rio de Janeiro.

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