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O cérebro, regulador dos impulsos

No artigo de hoje, a neuropsicóloga Celina Vallim, explica que o nível de desenvolvimento e habilidade da mente humana também é demonstrado pela capacidade de transformar a reação violenta e descontrolada numa atitude paciente e comedida.

Por: Dra. Celina Vallim
10/02/2022

Muita gente há de se lembrar do momento em que William Foster, personagem interpretado por Michael Douglas em Um dia de fúria, despeja sua raiva contra o mundo depois de uma série de experiências ruins. A pergunta que podemos nos fazer a partir desse episódio nada tem a ver com o que sucedeu em seu cérebro para provocar a reação que teve, mas sim com o que impediu que isso tivesse ocorrido antes.

A regulação das emoções exerce um papel fundamental na convivência da espécie humana (e, exagerando um pouco, na sua sobrevivência). Nós, seres humanos, temos a capacidade de transformar a experiência emocional ao mudar o significado que damos à situação que provoca a resposta emocional.

Num estudo sobre a regulação cognitiva, Kevin Ochsner, da Universidade Columbia, apresentou a algumas pessoas fotos com conteúdos emocionalmente intensos. Diante de cada apresentação, as pessoas deviam ou prestar atenção na foto ou reavaliá-la. Na condição de prestar atenção, os participantes deviam permanecer conscientes de sua reação emocional sem tentar alterá-la. Na condição de reavaliar, os participantes deviam interpretar a foto de maneira a não continuar sentindo as emoções negativas despertadas por ela, ou seja, deviam gerar sua interpretação alternativa ou uma história para cada fotografia que explicasse os acontecimentos negativos de um modo aparentemente menos negativo. O autor da experiência pôde observar que efetivamente as pessoas eram capazes de modificar o sentimento negativo das fotos apresentadas e que essa capacidade se associava à ativação de certas regiões cerebrais específicas. Observou-se assim a ativação de diferentes estruturas que formam o cérebro emocional num processo modulatório harmonioso.

As estruturas pré-frontais regulam as estruturas mais automáticas do cérebro emocional (como a amígdala) e o córtex cingulado cumpriria o papel de resolver as tensões entre os diferentes atores cerebrais da experiência emocional, ao agir como mediadores ou negociadores de conflitos.

Em estados de perturbação, como o do personagem de Michael Douglas, os mecanismos cerebrais que mantêm regulado o estado emocional se volta contra o sistema em seu conjunto e, em vez de agir como um filtro de nossa experiência, procedem como uma testemunha cruel e insensível às inclemências externas e às nossas limitações para enfrentá-las.

Desse modo, a ciência permite afirmar que o nível de desenvolvimento e habilidade da mente humana também é demonstrado pela capacidade de transformar a reação violenta e descontrolada numa atitude paciente e comedida. O bom andamento da corrida depende de diversas qualidades do cavaleiro. Uma delas, talvez a fundamental, é a de saber manter os pés firmes no estribo.

Texto extraído do livro: Usar o cérebro – editora planeta

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